quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Redes sociais e gerenciamento de crise


Como Brastemp, Renault, Arezzo e Twix reverteram a crise nas redes sociais

Casos recentes das empresas provam o poder de repercussão dos erros das marcas na internet
Letícia Alasse


 
Protesto de consumidor da Brastemp

Errar é humano, já diz o ditado popular, mas será que as marcas também têm esse direito? As mídias sociais se tornaram verdadeiras armas para os consumidores cobrarem serviços, demonstrarem indignação e não deixarem nenhum deslize das empresas passar em branco.


Nos últimos meses, companhias de grande porte como Brastemp, Renault, Mars Brasil e Arezzo estiveram expostas negativamente nas redes sociais e trabalharam para contornar o momento de crise.Os motivos que levam as marcas a grandes repercussões na internet são diversos e dificilmente poderão ser detidos pelas empresas. A solução é contornar o problema.

“As crises são desdobramentos de um fato, não são o fato em si. O mesmo fato pode ter desdobramentos totalmente diferentes em função da época e da cultura local”, explica José Eduardo Prestes, professor em comunicação corporativa na pós-graduação da ESPM e especialista em gestão de crises.


Não é de hoje que ocorrem crises gerenciais na relação das empresas com os consumidores, mas a mudança de ambiente destas questões trouxe muito mais abrangência e velocidade aos danos de imagem e reputação das marcas.

Se antes as reclamações dos clientes saiam em pequenas notas no jornal, poucas pessoas viam e, às vezes, apenas alguns funcionários da empresa sabiam do ocorrido, agora, a repercussão de um problema de um consumidor na web pode ter um alcance mundial. 
Não é uma Brastemp

A Brastemp foi uma das marcas que tiveram repercussão internacional recentemente com o caso do consumidor Oswaldo Borelli, que chegou aos Trending Topics Mundiais do Twitter.
A história começa quando o morador de São Paulo, após 90 dias sem geladeira e 10 ligações para o SAC da empresa, resolve colocar seu refrigerador Brastemp na porta de casa e gravar um vídeo contando todo o caso.


A Brastemp tomou conhecimento do vídeo no mesmo dia em que foi postado, quando o filme tinha apenas 200 visualizações.
“Nossa primeira posição foi resolver o problema do consumidor. A segunda foi verificar onde ocorreu a falha no atendimento. A partir disso, treinamos novamente todos os nossos profissionais que atuam no atendimento ao consumidor, para garantir que esse tipo de problema não voltasse a se repetir”, conta Cláudia Sender, diretora de marketing da Brastemp. Após reconhecer o erro, a empresa ainda prestou um esclarecimento por meio dos veículos de comunicação e aos consumidores na internet, explicando que havia entrado em contato com Borelli para solucionar o problema e lamentando o ocorrido.

“O caso da Brastemp teve uma repercussão grande, mas o posicionamento da empresa acabou revertendo o episódio. Quando o consumidor recebeu o refrigerador, todo mundo também ficou sabendo e acabou retornando para marca como algo positivo”, afirma Elizangela Grigoletti, gerente de marketing e inteligência da MITI Inteligência.

Meu Carro Falha 


Ao contrário da Brastemp, a Renault falhou na hora de gerenciar a crise e acabou por colocar um cliente na justiça. Para reclamar das tentativas de consertar o seu Renault Megani, que nunca saiu da garagem por problemas técnicos, Daniely Argenton criou o site Meu Carro Falha, em fevereiro de 2011, que chegou a receber mais de 700 mil visitas em um mês.

Diante da iniciativa, a montadora solicitou uma liminar judicial para que a consumidora tirasse o endereço do ar no período de 48 horas, além de todas as reclamações realizadas nas redes sociais.


“Quando a Renault utilizou o sistema jurídico para bloquear as ações da consumidora, transformou a crise em uma crise de caráter”, comenta Prestes, da ESPM.

Após discussões entre a consumidora e a empresa, ambas chegarem a um acordo, que incluia o pagamento das despesas e o ressarcimento em relação aos danos causados pelo veículo.


Consciente do erro, a Renault Brasil optou por lançar um comunicado se desculpando com o público em geral e doou um Clio 0km para a Associação de Assistência à Criança Deficiente (AACD).

Para a maioria dos especialistas, no entanto, a Renault demorou a agir e não conseguiu reverter a situação por completo, deixando o caso como um exemplo negativo de gerencimento de crise. Ao encarar o problema, a montadora deveria tê-lo solucionado imediatamente.


“O caminho correto para as empresas, quando encontram problemas deste tipo, é tentar resolver. Por causa de um carro, a Renault correu o risco de ter a imagem da marca manchada”, acredita a gerente de marketing e inteligência da MITI Inteligência.


Boicote Arezzo

Contrariando a máxima de que o cliente tem sempre razão, a Arezzo também não deixou os consumidores nada satisfeitos ao lançar a coleção PeleMania, composta por produtos feitos de pele de animais, em abril deste ano.


“Houve falhas em dois momentos. Primeiro no planejamento, em que a marca não levou em conta os interesses e expectativas do consumidor em relação aos preceitos atuais como sustentabilidade e cuidado com o meio ambiente. O segundo momento foi a forma como a empresa se posicionou. Em nenhuma circunstância a marca sustentou o objetivo de ter levantado a campanha e não apresentou uma posição sobre o tema”, comenta Elizangela.


Os internautas tampouco aprovaram a iniciativa e logo criaram protestos na web contra o comportamento da empresa. O caso foi parar em diversos portais de notícias e chegou ao primeiro lugar nos Trending Topics do Twitter.


Segundo o estudo da MITI Inteligência, a página “Boicote Arezzo” ultrapassou o número de usuários da fan page oficial da marca em pouco tempo e, no dia 29 de abril, o boicote já registrava 6.503 membros contra 5.234 fãs da Arezzo. 


Após o pronunciamento do presidente da empresa, Anderson Birman, a repercussão da marca se intensificou nas redes sociais. Entre 26 e 30 de abril, a Arezzo respondeu por 73,68% das interações nas mídias sociais, muito além de concorrentes como Via Uno (7,09%) e Schutz (7,32%), também de acordo com a pesquisa da MITI Inteligência. Deste percentual, 58,4% das citações eram negativas.

Para contornar o problema, a empresa colocou no site um comunicado ao público quatro dias após o início da repercussão e retirou toda a coleção das lojas.


“Não entendemos como nossa responsabilidade o debate de uma causa tão ampla e controversa. Um dos nossos principais compromissos é oferecer as tendências de moda de forma ágil e acessível aos nossos consumidores”, disse a companhia em pronunciamento, dando o assunto por encerrado.


“Mas não era disso que o consumidor estava reclamando, eles estavam questionando a postura da empresa de buscar alternativas como esta, simplesmente para moda e beleza. E a resposta não foi dada pelo canal correto. As reclamações estavam no Twitter e no Facebook, enquanto que a empresa se restringiu, no primeiro momento, a fazer uma notificação no site”, expõe Elizangela sobre o comunicado da Arezzo. 


Chuva de Twix

Outra ação mal sucedida por falta de planejamento ocorreu com a Mars Brasil. Neste caso, o feitiço virou contra o feiticeiro.


Após realizar uma campanha viral nas redes sociais, os erros de desenvolvimento da ação repercutiram a proporção do impacto da campanha sobre os consumidores.


O comercial viral prometia a distribuição de barras do chocolate Twix, no dia 30 de maio de 2010, em plena Av. Paulista, principal via da cidade de São Paulo, mas a promoção não saiu como o esperado.

A ação de marketing atraiu mais de quatro mil pessoas, ultrapassando as expectativas dos organizadores, e deixando metade do público de fora.


Somente duas mil pessoas entraram no espaço da chuva de chocolates e mesmo assim muita gente não conseguiu pegar nenhuma unidade. Ocorreram falhas nos canhões, e os produtos foram lançados junto com papéis dourado picados. A impressão foi de muita promessa para pouco Twix.

Os consumidores frustrados não deixaram por menos e a ação da Mars também parou nos Trending Topics Brasil do Twitter com as hashtags #chuvadetwix e #chuvadetwixfail, além de uma página agressiva na internet.


“O Twix não foi uma crise, foi transtorno operacional. Uma ação de marketing que não foi bem gerenciada. A aparição das reclamações nas redes sociais não causou danos à imagem do produto. Este caso é um exemplo de crise contingencial, que será rapidamente esquecida e não causará dano à reputação da empresa”, ressalta Prestes.


Após a tempestade 


Mas depois de todo o burburinho nas redes sociais e nos portais de notícias, como ficaram as marcas perante os consumidores? O vídeo do senhor Borelli permanece no Youtube, com 806 mil visualizações. Em contrapartida, a campanha da Brastemp, “O Dia em que um sorriso parou São Paulo”, no mesmo canal, possui mais de 2,3 milhões de visualizações.

“Não é bom ter alguém falando mal da sua marca nas redes sociais. É claro que isso vai surtir um impacto nos consumidores. Mas a Brastemp é uma empresa que está há 56 anos no Brasil. Os clientes acreditam na marca e são apaixonados por ela”, declara a diretora de marketing da empresa.


No mesmo patamar está a Mars Brasil, que alega que os consumidores usaram as plataformas sociais para comentar sobre o evento, da mesma forma que a empresa usou o canal para divulgar a ação.

No caso da Renault, o site Meu Carro Falha se tornou um canal de reclamações aberto ao público para compartilhar e buscar soluções para os problemas junto às montadoras.
Uma seção no portal, no entanto, aconselha os clientes a resolverem seus problemas por meio do SAC da empresa ou do Procon, e que apenas em última instância as insatisfações sejam publicadas nas redes sociais.


“Para os consumidores, a parte do carro já está superada, o que ficou foi a postura inadequada da empresa tentado cercear a liberdade de comunicação”, completa Prestes.

Já a Arezzo surpreendeu o mercado e os especialistas que apostavam num prejuízo da marca após o escândalo da coleção de pele de animas.


Além da fan page ter saltado de 5,3 mil usuários para mais 13,3 mil nos últimos meses, a empresa registrou um aumento no lucro líquido de 43,3% no segundo trimestre de 2011 em relação ao mesmo período de 2010 e um saldo positivo de R$ 24 milhões, com a venda de 1,56 milhões de pares de sapatos e 103 mil bolsas entre abril e junho.

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