segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Setor privado quer mais incentivos à inovação

Setor privado quer mais incentivos à inovação
 
Grandes empresas se reúnem para cobrar novo marco regulatório
 e levarão documento a presidente eleito


Nas últimas semanas, a Braskem, maior empresa petroquímica do país, analisa se irá desembolsar até US$ 10 milhões para montar uma planta semi-industrial que testará a produção de polímeros feitos à base de açúcar e bagaço de cana, para virarem futuras garrafas PET retornáveis.

Nesta fase de desenvolvimento, em que os estudos feitos em laboratórios ganham proporções pré-industriais, o risco de fracasso ainda é alto. Como terá de bancar todo o projeto, a empresa avalia os prós e os contras. Segundo Paulo Coutinho, gerente de inovação da empresa, se o risco fosse dividido com o governo, a decisão sairia de forma mais rápida e fácil.

Exemplos como esse espalham-se por empresas de diferentes setores. A falta de incentivos para que produtos inovadores descobertos no país possam passar para uma etapa pré competitiva, mais avançada, leva muitos projetos a se perderem nesta fase do "Vale da Morte", como é conhecida entre os especialistas.

Este é um dos gargalos remanescentes da Lei de Inovação, sancionada em 2004, e nas demais que surgiram, como a Lei do Bem, de 2007.

Para contornar esses obstáculos, empresários brasileiros reunidos no Movimento Empresarial pela Inovação (MEI) decidiram fazer pressão sobre o próximo governo para que seja estabelecido um novo marco regulatório que incentive de forma efetiva a inovação no país. A conclusão é que a lei não pegou de forma eficaz, e as iniciativas no Brasil existem por ações pontuais do setor privado.

A principal novidade das leis de Inovação e do Bem foi a possibilidade de aplicar recursos públicos para incentivar e subsidiar projetos inovadores. Cerca de R$ 2 bilhões já foram alocados para isso desde 2006, mas várias lacunas ainda existem.

Reunidos no fim de setembro em São Paulo, presidentes de grandes empresas, como Embraer, Natura, Grupo Ultra e Siemens, fizeram um diagnóstico prévio ao presidente do BNDES, Luciano Coutinho. Eles admitem que o Brasil já conta com instrumentos de apoio a pesquisa e desenvolvimento (P&D), mas dizem que é preciso melhorar.

Vários problemas foram apontados. Entre eles, a falta de visão empresarial dos órgãos de fomento (como Finep e CNPq) e a ausência de financiamento para projetos de grande porte, por medo que o setor público tem dos órgãos de controle, como Tribunal de Contas da União (TCU) e Controladoria Geral da União (CGU).

Outra queixa é que o governo não faz políticas de inovação setoriais, o que dispersa recursos.

E também não há investimento em plataformas de inovação para processos de longo prazo, o que significa dizer que o tempo para elaboração de produtos é geralmente curto demais.

Esse diagnóstico deve se transformar em um documento inédito, que será apresentado ao presidente que será eleito em 31 de outubro. Para o setor privado, é preciso resolver esses gargalos, para conquistar competitividade no mercado internacional a médio prazo. É o que alerta o professor da Unicamp Carlos Pacheco, consultor da Confederação Nacional da Indústria (CNI):

- Precisamos de um choque de inovação, sob risco de continuarmos exportadores de commodities. Nossa produtividade ficou parada no tempo. As decisões de agora terão resultado em quatro ou cinco anos, mas as mudanças estruturais na indústria demoram ainda mais.

Financiamento deve chegar a R$ 4 bi este ano

Cerca de dois terços de todo apoio dado à pesquisa e desenvolvimento (P&D) do setor privado são ainda decorrentes da renúncia fiscal da Lei de Informática. Segundo um documento da Confederação Nacional da Indústria (CNI), quando é excluído esse instrumento, a posição brasileira no mundo, em termos de incentivos à inovação para o setor privado, é frágil.

Mas, segundo dados da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), principal braço governamental de fomento, os valores têm crescido. Passou de R$ 250 milhões em 2000 para R$ 3,522 bilhões em 2009. Este ano deve bater R$ 4,161 bilhões.

Porém, em relação ao Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos no país), todo o apoio brasileiro (incentivos fiscais e subvenções) corresponde à metade do que é na Espanha, a um terço nos casos de Japão e Reino Unido e a um quarto de EUA e França.

Para Frederico Curado, presidente da Embraer, há "dificuldade intrínseca" de financiamento a fundo perdido. "Prevalece o entendimento de que grandes projetos, especialmente quando associados a grandes empresas, não deveriam ser prioritários, reservando os recursos públicos para PME (pequenas e médias empresas)", disse em discurso.

Falta dinheiro para indústria, sobra para universidade Pedro Wongtschowski, do Grupo Ultra, lembra que nos EUA e na Europa existem políticas para transformar invenções em protótipos. Pedro Passos, da Natura, e Adilson Primo, da Siemens, alertam para a falta de uma política setorial.

Luiz Antonio Coelho Lopes, superintendente de Inovação para a Competitividade Empresarial da Finep, admite que o setor privado tem razão em reclamar.

Segundo ele, sobra dinheiro para inovação nas universidades, mas há escassez para a indústria, cuja demanda só aumenta. Um dos problemas é que a lei permite a concessão de subsídios para o custeio de inovação, mas não para os investimentos.

- Ainda é preciso regulamentar muita coisa da Lei de Inovação - resume Lopes.


(Gustavo Paul)
(O Globo, 18/10)

Um comentário:

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